sábado, fevereiro 28, 2009

1953. Sinfonia Nº 10 - Dmitri Shostakovich

A Sinfonia Nº10 de Dmitri Shostakovich marca a reabilitação do compositor na União Soviética, graças à morte de Josef Staline em 1953. O final do quarto andamento é, diz-se, um retrato musical do ditador, realçando a sua brutalidade e sugerindo a "banalidade do mal"(1). A utilização do metrónomo num ritmo alucinante é a marca distintiva da gravação dirigida por Herbert Von Karajan, que conduz a Orquestra Filarmónica de Berlim a uma performance memorável.

O Allegro do 2º andamento desperta em mim sentimentos intensos, furiosos, quase violentos. Tal não surpreende. Nesse sentido, o contraste entre andamentos dificilmente poderia ser mais pronunciado. Por contraposição, o primeiro andamento é de uma beleza melódica trágica, marcado por oscilações entre a contenção sinistra e as explosões sonoras de contornos épicos. Há qualquer coisa de verdadeiramente inquietante neste primeiro andamento, em que o cronómetro ultrapassa os 22 minutos. Não sei se é a ausência de uma estrutura facilmente apreensível nas primeiras audições, ou o "sentimento avassalador de uma angústia sublimada" (2) de que falam as críticas à obra. Mas é impossível não sentir essa inquietude perante música tão densa e crispada.
1. Moderato (mp3 excerto)
2. Allegro (mp3 excerto)
3. Allegretto
4. Andante - Allegro

(1) Solomon Volkov, Testimony: The Memoirs of Dmitri Shostakovich, Limelight Editions, 2004.
(2) Richard Osborne, notas da edição Shostakovich, Symphony nº10 in E Minor, Op.93, Berliner Philarmoniker conducted by Herbert Von Karajan, Deutsche Grammophon, 1981

Projecto 200 anos de música. A ideia é simples. Ao longo de duzentas entradas, o Piano na Floresta vai listar duzentas obras musicais, uma por cada ano, iniciando a contagem decrescente a partir do ano 2000. Se tudo correr conforme planeado, será possível identificar um disco ou uma obra composta em cada um dos anos no intervalo entre o ano 1800 e o ano 2000. Não há limitações de género musical. A qualidade e a reputação da obra não constituem critério de escolha, embora se entenda que ela é, de algum modo, representativa do ano em questão.

sábado, fevereiro 07, 2009

1954. Louis Armstrong Plays W.C. Handy

Louis Armstrong é provavelmente o mais famoso músico de jazz de todos os tempos. Na interpretação dos temas mais famosos de W.C.Handy, considerado o pai dos blues, o vocalista e trompetista atinge níveis de intensidade, perfeição e exigência só acessíveis a um predestinado. A orquestração é excelente e a produção límpida ao ponto de permitir aos restantes músicos um lugar de destaque para além do próprio Louis, com particular destaque para Barney Bigard no clarinete e Billy Kyle no piano. Os duetos de Louis com a voz encantadora de Velma Middleton transmitem a química das grandes parcerias, sobretudo em Lovess Love, Long Gone (from the Bowlin' Green) e na épica versão de St. Louis Blues.

Ouvir os blues de W.C.Handy interpretados por Louis Armstrong and His All-Stars é quase uma experiência religiosa, porque deve ser saboreada em condições apropriadas. Um sofá confortável, um Jack Daniels na mão e a ausência de companhia, são indispensáveis para poder disfrutar dos blues na sua plenitude. A tristeza toma outra dimensão quando é partilhada, ainda que seja discutível se ela aumenta ou diminui em função dessa partilha. Tal como a partilha da tristeza não nos deixa indiferentes, o mesmo se pode dizer deste disco memorável, uma das últimas grandes interpretações de Louis Armstrong.

A gigantesca versão de Saint Louis Blues, uma das melhores de todos os tempos, pode ser escutada integralmente no You Tube:

Projecto 200 anos de música. A ideia é simples. Ao longo de duzentas entradas, o Piano na Floresta vai listar duzentas obras musicais, uma por cada ano, iniciando a contagem decrescente a partir do ano 2000. Se tudo correr conforme planeado, será possível identificar um disco ou uma obra composta em cada um dos anos no intervalo entre o ano 1800 e o ano 2000. Não há limitações de género musical. A qualidade e a reputação da obra não constituem critério de escolha, embora se entenda que ela é, de algum modo, representativa do ano em questão.