A polémica gerada em torno da presença de crucifixos nas escolas incomoda-me. Sou católico não praticante, a "religião" da grande maioria dos portugueses, e devo dizer que a presença ou ausência de crucifixos me deixa relativamente indiferente. Compreendo que sempre que alguém de outra religião se manifeste incomodado com a presença de um crucifixo na parede de uma instituição pública, seja obrigação dos responsáveis a retirada do dito objecto. O respeito pelas outras religiões assim o justifica.
Já tenho maior dificuldade em compreender o argumento da separação entre Igreja e Estado. Não posso deixar de discordar daqueles que defendem a laicidade com a mesma cegueira do fundamentalismo religioso, ignorando centenas de anos de tradição judaico-cristã em Portugal. Tirar os crucifixos das paredes a todo custo, pela simples razão de termos um "Estado laico", menospreza valores actualmente promovidos pela Igreja Católica que deveriam ser preservados, como sejam a paz, o respeito pelos outros e o diálogo ecuménico.
A experiência francesa de proibição da ostentação de objectos religiosos nas escolas por parte dos/as alunos/as é um exemplo do tal fundamentalismo laico e jacobino que critico. Um sector da sociedade americana também considera a hipótese de acabar com o moto "In God We Trust", que tem mais de duzentos anos e expressa um conjunto de valores comuns aos "Founding Fathers". Estes movimentos mais radicais de secularização passam uma mensagem de intolerância e seriam impensáveis, pelo menos nos tempos mais próximos, num país como Portugal.
Mas, apesar disso, fico preocupado com o discurso inflamado da esquerda mais radical, que sente horror com a possibilidade dos miúdos ficarem "contaminados" pelo "vírus do cristianismo", só por haver um crucifixo na sala onde têm aulas. Só para os descansar, devo dizer que estudei 12 anos num colégio católico e nem me recordo se existiam ou não crucifixos nas salas de aula. Provavelmente existiam. Seja como for, não é isso que determina se alguém é não um bom cidadão.
P.S.: Francisco Sarsfield Cabral escreve sobre o assunto no
DN de hoje.